segunda-feira, 21 de junho de 2010

Entrevista



O cheiro de poeira de algum sebo ou aquele plástico inconveniente que embala o cd, a capacidade da imagem tornar a canção algo físico e a estante mais colorida pela diversidade trazendo uma identificação capaz de fazer o colecionador passar horas envolvido ali, ouvindo, tocando e olhando. Não fosse o lado emocional da coisa, a identificação proporcionada também pela imagem, os downloads já teriam jogado vinis e CDs para escanteio. Independente da facilidade de se baixar qualquer álbum, existe cada vez mais a necessidade de consumir algo além da música, qualquer coisa capaz de acompanhá-la.
A música é a arte completa, sensorial e performática. Por ela, o ser humano é capaz de definir seus interesses e formar grupos para consumo ou produção cultural, que está cada vez mais acessível. É possível revisitar outras décadas, desconstruir e reconstruir mesmo dentro de casa, com alta qualidade. Tal facilidade faz com que o mainstream não seja mais a única forma de se chegar ao público. Por isso, a imagem é uma referência forte de aproximação entre produtor e ouvinte.
Atento a isso, o musico e produtor Marcel Dadalto, percebeu o crescimento na produção cultural ao seu redor - em tempos de internet, pouco importa a localização. Ele, que é programador da banda Zémaria desde 2002, se uniu a amigos possibilitando uma projeção em grupo. Em 2009, criou o coletivo e selo Smoke Island.


Na entrevista abaixo, ele comenta as mudanças do mercado fonográfico no que diz respeito à imagem e sua relação de músico e também consumidor.

- Como você avalia a junção de música e imagem no Zémaria?


Marcel: Acho que as duas coisas se complementam. A arte de um disco pode dizer muito sobre o conteúdo das letras, o clima que se quer passar com as músicas ou mesmo dar uma "cara", uma imagem para o trabalho.




- Como foi o processo criativo da capa do The Space Ahead? Vocês escolhem de acordo com as músicas?


Marcel: Foi tudo em função do título. Tudo veio a partir das nossas idéias e devaneios em cima do nome The Space Ahead, e suas várias formas de interpretação. A gente ficou dias pesquisando referências de imagens e outras capas de bandas. Chegamos a 2, 3 resultados diferentes e fizemos uma montagem resultante destes testes.




- Você acha que o cuidado na arte gráfica de um álbum tem grande importância?


Marcel: Sim, muita! Quem nunca comprou um disco pela capa, ou baixou algo só por que a foto de divulgação era bacana? A imagem muitas vezes chega na frente da música.



- Conhece algum álbum que tinha a arte de baixa qualidade, mas musicalmente era ótimo? E o contrário?

Marcel: Nossa isso rola muito. As duas situações são muito comuns no mundo da música. Mas aí vai de cada um fazer o seu próprio filtro também, e escolher o que quer assimilar de cada artista. A capa do disco do Phoenix acho meio sem sal, mas as músicas são incríveis.


- Alguma capa de disco te marcou?

Marcel: Eu adoro o poder de síntese, o minimalismo, estéticas que conseguem expressar muita coisa com muito pouco. O Substance, do New Order, por exemplo. Lembro que eu fiquei muito intrigado pra saber que tipo de música poderia ter aquele disco com a capa toda branca. Acabei virando fã deles depois de ouvir as músicas deste álbum. Como podia aquela capa tão despretensiosa com músicas tão fodas?


- A capa te influencia na compra de um disco?

Marcel: Com certeza! Principalmente quando estou procurando coisas novas pra ouvir, me deixo levar bastante pela arte gráfica em geral. Não só a capa, mas também o layout do myspace, foto de divulgação, logo.


- Que tipo de cuidado vocês da Smoke Island tem em relação arte dos EP's?

Marcel: A gente tenta fazer um padrão do selo. Mas de uns tempos pra cá a coisa tem sido mais livre e os artistas tem trazido suas próprias referências e códigos. Acho isso ótimo porque diversifica e representa bem o que estamos fazendo com a música, já que cada artista do selo segue por um caminho diferente.


- Você acha que a capa já ditou o sucesso de algum disco? Qual?

Marcel: Sucesso não sei, mas polêmica já rolou muita. Já teve muito disco que teve que refazer a capa pra entrar no mercado americano, que é bem mais careta, por exemplo.


- Com o surgimento de novas tecnologias e todas as últimas mudanças no mercado fonográfico, você acha que a preocupação estética da arte está mudando?

Marcel: Mudando está, mas não sei se para melhor. Eu particularmente tenho ficado meio de bode dessas capas de photoshop. Gosto tanto daquelas capas que são realmente trabalhos artísticos, ou mesmo fotos. Não sei se falo isso por que nossa última capa foi de photoshop, e sempre quando fazemos alguma coisa, depois queremos a antítese do que acabamos de fazer, mas penso em nos próximos discos, tentarmos algo mais orgânico,mais arte e menos computador, com era antes dos anos 2000. Mas isso pode ser apenas uma viagem nossa, que sempre estamos querendo fazer algo que ainda não fizemos.


- Antes, a arte gráfica era a forma mais evidente para vender além da própria música. Hoje em dia existem milhões de formas, qual você acredita que seja a mais forte? Seria capaz de superar o grafismo?

Marcel: A mais forte é a foto flagrante, o paparazzi, a polêmica besta e boba. Eu não curto nada disso, não acho que o Zémaria participe deste mundinho, mas reconheço que o mainstream da música hoje em dia está muito assim, sem graça, sem arte. Exemplos não faltam. Liga no Faustão ou no TMZ que você vai ver.






Postado por Alberto Lobo e Raisa Carlos de Andrade

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